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Acórdão. Programa Supernany/Acão Especial de Tutela de personalidade. Direito à imagem. Direito à reserva sobre a intimidade da vida privada. Menor - maturidade para avaliar as consequências do seu consentimento.

27 fev 2019

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11-12-2018 (Acórdão)

 

SUMÁRIO:

1- Apesar da deslocação para o âmbito dos processos especiais, o legislador de 2013 manteve no Processo Especial de Tutela da Personalidade algumas características típicas dos processos de jurisdição voluntária, corno sejam o poder/dever de o juiz aplicar a medida mais adequada ao caso, determinando o comportamento concreto a que o requerido fica sujeito e podendo alterar a medida que aplicou provisoriamente, sem estar limitado, nos termos do art° 609° n° 1 do CPC/13, quantitativa e qualitativamente pelo pedido formulado.

2- Mais importante que reprimir, punir, indemnizar ou atenuar é crucial que o Direito faculte meios hábeis e eficazes para prevenir lesões do Direito de Personalidade. O decretamento de providências preventivas depende da invocação de factualidade que, por verosimilhança, permita concluir pela probabilidade séria da verificação da lesão eminente: a manter-se a situação factual conhecida, ocorrerá a lesão do direito e, por isso, decidem-se medidas adequadas a preveni-la.

3- Para que sejam deferidas providências de Tutela de Personalidade basta a verificação do facto voluntário e ilícito de que resulte ou possa resultar ameaça ou ofensa ao direito (de personalidade) não se exigindo a culpa, nem a produção de danos, nem a alegação (e prova) dos requisitos típicos dos procedimentos cautelares: fumus boni iuris, periculum in mora, proporcionalidade e adequação.

4- Tal como sucede com o Direito à Imagem, também o Direito à Reserva Sobre a Intimidade da Vida Privada pode sofrer limitações voluntárias pelo seu titular. No entanto, só quando não forem contrárias a Lei injuntiva, aos bons costumes, à ordem pública, nem física nem legalmente impossíveis é que essas limitações voluntárias dos Direitos de Personalidade são lícitas.

6- Se o menor dispuser de discernimento e maturidade suficientes que lhe possibilitem avaliar correctamente o alcance e as consequências do consentimento limitativo dos seus direitos de personalidade, deve ser ele e não o(s) representante(s) progenitor(es) a consentir nessa limitação. Nos casos em que o menor não tiver maturidade para avaliar as consequências do seu consentimento, de fure condendo, deve ponderar-se a opção por uma solução em que os progenitores apresentem projecto de consentimento ao Ministério Público, que a ele se poderá opor, com possibilidade de recurso para o tribunal.

7- A participação de menores em Espectáculos está sujeita a comunicação e pedido de autorização, nos termos dos art°s 2º a 11º da Lei 105/2009, de 15/09, e depende de prévio acordo da CPCJ, sob pena de não poder ser levada a cabo e de ser considerado nulo, por violar norma imperativa, o contrato celebrado sem a referida autorização.

8- E sendo nulo o consentimento dado pelos progenitores, a limitação ao direito à imagem e à reserva sobre a intimidade da vida privada dos menores, ao participarem nos programas, é ilícita, com as consequências daí advenientes, designadamente no que toca à possibilidade de serem solicitadas medidas de tutela do direito de personalidade dos menores.

9- Existe conflito de interesses quando o representante legal dos interesses do menor, descurando o superior interesse do representado actua, ainda que negligentemente, priorizando interesses próprios.

10- Á luz dos art°s 3° n° 1, al. a) e 5° n° 1, al. c) da Lei 47/86, de 15/10, conjugados com o art° 23° doCPC/13 e art°s 1920°, e 1893 n° 3 do CC, pode defender-se a atribuição de poder de representação activado menor em juízo ao Ministério Público nas situações de conflito de interesses com os progenitores.

 

Desembargadores: Gilberto Jorge - Maria de Deus Correia 

Sumário elaborado por Susana Leandro